Os bugres

Disponibilidade: Brasil

São muitas mulheres aqui. Elas procuram Sindá, sempre secretamente, na hora em que seus maridos não estão em casa. Por vezes procuram a mãe de santo para, justamente, conseguirem a graça de um emprego para os próprios. Ou para pedirem saúde. Uma vida surda e pobríssima porque, quando Sindá aconselha que procurem um médico, logo é enxovalhada, a maior parte das pessoas crê que os feitiços têm de sanar tudo. Não consegue mais explicar, não tem mais forças para dizer que estão equivocadas.

R$120,00

_sobre este livro

O subúrbio carioca retratado neste Os Bugres, de Rodrigo de Roure, com sua profusão sensorial de cores, cheiros e sabores, além de cenário e personagem, é também um símbolo poderoso a sintetizar tema e forma: tudo nesta narrativa paira suspenso em um entrelugar, evocando os bairros esquecidos nas franjas do que os cartões postais (e o poder público) consideram que seja a cidade. O olhar de cronista do autor nos coloca diante de um painel vibrante de tipos humanos que, para além de personagens exemplares (não são estereótipos nem arquétipos, muito menos modelos de conduta), encarnam na trivialidade de seu cotidiano embates silenciosos (ou silenciados?), mas não menos fundamentais. Figuras masculinas se apequenam diante do farfalhar de saias que preenche os vazios do texto, mas ao mesmo tempo mulheres fortes e desejantes não deixam de ter seu prazer interrompido e medido em função dos homens. A vida no subúrbio pulsa clandestina, conciliando de maneira singular liberdade e opressão. Portões e soleiras são fronteiras porosas entre o público e o privado, espaços que se fundem nas belíssimas cenas coletivas de celebração da vida e enfrentamento da morte, verdadeiros ritos que nos colocam diante de uma sociabilidade na qual os laços comunitários valem mais que o sangue.

No centro dessa experiência solidária está um narrador ambíguo que, no limiar entre dois mundos (o do texto e o do leitor, e tantos outros a se descobrirem), tem a prerrogativa de, ao enunciar, dar a existir as vidas que se descortinam diante nós. Essa voz incorpórea e anônima é também errática: não só porque vaga sem rumo, fixando-se a esmo nas figuras por quem se apaixona e, para nosso deleite, passa a acompanhar. Ele é errático também porque recusa o papel de detentor da verdade do que conta. Entretanto, como todo bom e velho contador de histórias, não pode recusar a autoridade (não o autoritarismo) da sua enunciação. Já disse Walter Benjamin que o narrador é quem sabe dar conselhos, e por isso é ouvido e respeitado pela comunidade. Mais ainda: o conselho tecido na experiência converter-se em sabedoria. Essa sabedoria, no entanto, nunca é signo de discriminação, mas objeto de partilha, como sugere o adágio africano: “O ensinamento se dá de boca perfumada a ouvidos dóceis e limpos” – como estas orelhas, que aceitaram o convite ao diálogo e agora convocam os leitores e as leitoras a afinarem a escuta e engrossarem a comunidade de ouvintes dispostos a resistir ao embotamento das nossas memórias.

Raquel Souza

_outras informações

isbn: 978-65-5900-104-0
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 14x22cm
páginas: 736 páginas
papel: pólen 90 gramas
ano de edição: 2021
edição: 1ª

Carrinho

Cart is empty

Subtotal
R$0.00
0