Em meio ao agreste paraibano, Dona Catirina abre a estrada para uma liberdade clandestina contra um passado obscuro. Do alto da morada dos deuses, no Monte Olimpo, Hera se confronta com seus anos na sombra do rei dos olimpianos. Em florestas e campinas marcadas por guerras passadas, os andarilhos dos ramos e dos ventos, ao mesmo tempo xamãs e músicos, ressoam suas flautas para conversar com os elementos e enfrentar ameaças antigas. Nas Cordilheiras de Ashuran, um local tão desafiador quanto vasto, com montanhas retorcidas em ângulos antinaturais, nuvens de cinzas e rios de lava, apenas a solidariedade, os sonhos e as histórias ancestrais garantem a sobrevivência de um distinto povo fauno e serão cruciais para dois irmãos enfrentarem o luto por suas perdas e a marca daquilo que é irreparável neles. Esses são só alguns dos personagens e cenários presentes em Corpo Estrada, uma coletânea de contos que abre as portas para mundos nada distantes da cultura popular brasileira, com releituras habitadas por criaturas como o Boitatá, Naiá, Mani, entre tantos outros, repletas de aventura, mistério, suspense e reflexão.
Com uma escrita perspicaz, leve e cuidadosa, o livro passeia por cenários mitológicos, cosmogônicos, históricos, contemporâneos e até mesmo por mundos inéditos, da fantasia ao realismo fantástico, para acompanhar os passos e sentidos do corpo, que é flor do espírito, e da alma, fruto do corpo, que não andam separados aqui. Passos esses de diversas corporeidades de criaturas animais, povos, objetos, lugares, deuses e guardiões ancestrais necessariamente marcados pelas relações que implicam as palavras e pelas relações humanas que marcam os corpos e são o cerne de toda literatura, e que aqui criam estradas para o enfrentamento da perda, das relações de dominação e de abuso, para que se possa desvelar, numa lenta e desafiadora abertura aos outros e a estranheza que isso implica, o desabrochar de novos mundos.