Calor de março

Disponibilidade: Brasil

Acordar esgoto
Quente, fétida
e morta
Ser humana tal qual
um caldo espesso de
desejos-dejetos derretidos
No calor da angústia

R$52,00

_sobre este livro

Calor de março marca a estreia de Lohaine Miguez na poesia, apresentando-se como um convite à travessia por labirintos de sensações, inquietações e epifanias. Em seus 76 poemas, Lohaine transforma experiências cotidianas e angústias universais em versos que oscilam entre o corte e o afago, estabelecendo um diálogo rico com a tradição poética brasileira, desde a rebeldia de Belchior, presente já na epígrafe, até o existencialismo de Gilka Machado e de Mario Quintana.

O título evoca a sensação sufocante do calor que marca o fim do verão, metáfora que se desdobra em estados emocionais variados ao longo da obra. O poema “Negativo” explora a matemática do sofrimento: “Toda semana, tenho / morrido três vezes. / E renascido duas”. A morte simbólica reaparece em “Ai de mim” — “Ai de mim, ai de mim / se não fosse a poesia. / Como eu faria para morrer / tantas vezes e, ainda assim, / continuar viva?” — e encontra eco nos versos de Mario Quintana — “Da primeira vez que me assassinaram, / Perdi um jeito de sorrir que eu tinha. / Depois, a cada vez que me mataram, / Foram levando qualquer coisa minha”. Em Lohaine, a poesia emerge como espaço privilegiado de reinvenção da vida.

A obra é atravessada por imagens uterinas e fetais, possível reflexo da formação em Psicologia da autora. Em poemas como “Autoabortável”, “Amniótico” e “Romaria”, o útero simboliza simultaneamente proteção e angústia, numa ambivalência que ecoa teorias psicanalíticas sobre o desejo de retorno ao estado pré-natal. Em “Lar-falo”, a vulnerabilidade feminina é exposta em uma sociedade que nega proteção e equidade de gênero: “Eu chorei pela / falta / da proteção / Muro maciço / Pele materna / Barriga // Tampouco saí, / tocaram-me as mãos / do gatilho / Dele. / Que me deu meia vida / E tirou outras inteiras / Sem dó”. Para as mulheres, nem mesmo o lar é sinônimo de segurança.

Apesar da densidade temática, Calor de março oferece vislumbres de esperança. Em “Resistência”, gestos cotidianos como “o café quente e amargo” ou “o ‘crock’ do pão levado aos dentes” tornam-se rituais de sobrevivência, mostrando como pequenos atos podem ancorar o sujeito na existência. É nesta tensão entre desespero e resistência que a obra encontra sua força maior. Conjugando sua formação em Literatura e Psicologia, Lohaine Miguez constrói uma poética que transcende o mero registro confessional, alcançando uma dimensão universal que dialoga com as experiências mais profundas do ser humano contemporâneo.

 

Anna Faedrich

Professora de Literatura Brasileira na Universidade Federal Fluminense

_outras informações

isbn: 978-65-5900-896-4
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 13x16,5 cm
páginas: 120 páginas
papel polén 90g
ano de edição: 2025
edição: 1ª

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