_sobre este livro
O interesse pelo que há de mágico, incógnito e sapiencial na linguagem marca fundamente a poesia de Elson Fróes. Em seus trabalhos, os possíveis – e sempre abertos – sentidos deslizam explicitamente entre diferentes línguas e códigos. Deslizam como no poema “Lizard”, ou em “Gertrude Stein in the NET”, entre outros. A este deslizamento (a viagem) entre códigos Fróes chama “tradução intersemiótica”, procedimento estudado de modo pioneiro por Julio Plaza e que está na base da criação da maior parte dos poemas deste livro.
No poema “Gertrude Stein in the NET”, Fróes toma o famoso verso reiterativo “a rose is a rose is a rose”, de Stein, substitui a palavra “rose” pelo emoticon de rosa ( – < – <@) e dá ao conjunto uma forma circular. A substituição da palavra pelo emoticon, se por um lado lembra visualmente a imagem de um botão de rosa, por outro enfatiza seu caráter de signo, de artifício humano. Este e vários poemas do livro foram transformados pelo autor em GIFs e/ou videopoemas, o que confirma essa busca de sua poesia pela constante tradução e mutação em outros códigos e suportes. Busca, esta, também perceptível no fato de que Fróes, algumas vezes, cria uma nova fonte tipográfica para a realização de um determinado poema. Forma e conteúdo assumem relação muito íntima, desígnio que o poeta abordou no poema “XXX”, no qual retrabalha formalmente a frase de Fernando Pessoa “tornei minha alma exterior a mim”.
A tradução intersemiótica, tão presente nos poemas deste livro, é também um procedimento intertemporal. Épocas diferentes – e, acrescentaria: lugares diferentes – são marcadas(os) por dispositivos semióticos diferentes. O tempo é um tema recorrente na poesia de Elson Fróes, como podemos constatar nos poemas “sol no templo”, “devir/dever”, “tempo espelho”; “autopsia das utopias”, “caixa”, “lápide” e “Orfeu”. No poema “tempo espelho”, por exemplo, a estrutura visual do texto e a tipologia utilizada realçam uma simbiose das duas palavras de modo a romper a linearidade vigente na concepção contemporânea de tempo. Mas, o tempo, para Fróes, não é apenas um tema; ele está entranhado nos próprios procedimentos de criação, como podemos ver em “alvo”, “recifra-te ou devoro-me” e “love poem”. O primeiro utiliza linguagem poética e tipologia gráfica de inspiração camoniana; o segundo se vale de hieróglifos egípcios de uns 3.000 anos de idade; o terceiro tem como eixo uma runa secular. Em todos eles, o que nos toca não é um fetichismo saudosista, mas um
estranhamento que suspende as noções estabelecidas dessas marcas semióticas de diferentes tempos e lugares e as fazem se interconectar com o tempo presente.
Assim, este livro é importante por reunir grande parte da produção poética – que andava dispersa – de um poeta raro pela constância e coerência de sua pesquisa. A reunião desta obra permite compreender a dimensão dos desafios que Elson Fróes tem enfrentado na tarefa de “airar o que empedra”.
Julio Mendonça