Cefas Carvalho reúne em Sismos poemas em estado terroso, de solo, epicentro e lava, talvez um pouco de fogo, mas sem voos ou águas. Poemas arenosos que transformam a aridez em ar possivelmente respirável. Ao lê-los, temos a sensação de um soco, mas também de um sopro.
Como um Hades grávido de cactos e pedras, talvez também grávido de mortes, esse poeta nos brinda, em seu primeiro livro de poemas, após o livro de contos Não sei quantas almas tenho, com um diálogo com o chão, a terra, o espaço seco, vazio de estrelas, pleno de ecos bárbaros e diários.
Sim, é um jornalista que escreve, e, como tal, a rispidez da existência aparece. Além disso, é também um autor de quatro romances publicados com as trepidações, já sem muitos devaneios, de um homem em sua quinta década de vida.
Ler Sismos também é encontrar Perséfone beijando o submundo, tecendo com agave e sal as linhas mais duras da vida e da morte. Ícaro às avessas, Cefas mantém o corpo poético no plano médio e baixo, quase réptil.
Esse convite à dureza provoca um impactante espanto filosófico. Tal qual uma pedra na garganta, é uma poesia que dói com pouco sangue, mas lateja e fere como treva.
Terminamos a leitura deste livro com essa treva nas mãos: meio planta, buscando ar, sol, raiz. O poeta trouxe duras sementes para que possamos plantá-las sob nossos pés. Lê-lo é também dialogar com a terra escura, com a morte e a sorte.
Entre bordados, fardos, rochedos, azulejos, o poeta tece e destece sua tapeçaria e nos apresenta um livro sem ardência nem dor, mas com uma árida e cálida força, como no poema “Ícaro, não!”:
o firmamento
deixo para
vocês
que voem em vão
em paz
desejo o solo
o chão
e nada mais.
Enfim, convidamos todos e todas a essa leitura ríspida e bela.
Iracema Macedo,
poeta e professora de Filosofia do Instituto Federal Fluminense