Eu tinha ganhado um peixe novo pra botar no aquário. Um maiorzinho, azulado. Acordei numa manhã e dei com ele morto, virado, boiando de barriga estufada pra fora d’água. Tinha comido os outros peixes. Eu lembro de chorar por horas. Até contar a história pra alguém e ouvir uma risada. Não sei quem foi, meu pai ou algum primo, só sei que alguém riu e eu parei de chorar pra tentar entender como aquela tragédia podia ter graça.
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_sobre este livro
Tem a beleza e a violência dos fragmentos.
Explico: o pedaço de algo, por exemplo, pode ser cortante. Cheio de rebarbas e farpas. Pode ser agudo e imperceptível até que se torne um incômodo descabido. Ainda assim pode ser também mais delicado que o todo. Mais lúdico. Dá pra brincar de encontrar formas nos fragmentos. Não como as nuvens, mesmo que sejam elas também fragmentos de outra coisa que não saberemos nunca explicar o que é. Definitivamente não como nuvens, mas talvez como os fragmentos da entrada de um asteroide na atmosfera terrestre, que, por alguns segundos, podem ser lidos como constelações estilhaçadas.
Os contos da Bié fazem parte dessa categoria: asteroides colapsados. E coisas que caem no olho.
“Vamos pra um lugar mais tranquilo então, pra você pensar. Eu paralisei por um segundo, não adianta a história ser boa e não viver pra contar. Vai dar certo, na rua a gente corre, ele me disse por telepatia.”
Eu tô falando desses tipos de fragmentos aos quais é possível atribuir completudes irreais. Impalpáveis. Gasosas, ainda que presentes. Comuns. É, talvez eu esteja mesmo falando de nuvens. Fragmentos de cumulonimbus em fevereiros preguiçosos.
“O sol forte queima o silêncio dos prédios, a cidade está deserta. O único som é o chuveiro de Marina. O homem põe o cachorro no chão e ajeita as calças. Vai até a caixa d’água, instalada numa base de concreto com três degraus largos, e a destampa.”
Peixe no asfalto é a companhia afável de um conhecido. Que não íntimo demais a ponto de ser impelido a te dar conselhos e lições, nem distante a ponto de não sentir confiança em te confessar pequenos delitos. Num local público. Com chuva caindo nos olhos.
Bobby Baq
_outras informações
isbn: 978-65-5900-624-3
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 13x19 cm
páginas: 60 páginas
papel polén 90g
ano de edição: 2023
edição: 1ª