Um desvario, mas e daí? Vejo o Brasil como um balão desses de propaganda ou daqueles que Escolas de Samba utilizam quando precisam de uma lua alegórica. Gigante, suspenso, lindo, verde, azul e marrom, preso por poucos fios. Balançando no ar e fazendo sombra densa ao pedaço de chão de onde se soltou com asco: terra arrasada, cupinzeiro, pasto seco, espólio de incêndio e miséria, cravejado de grandes varandas gourmet de cem metros quadrados, com seus vidros verdes, shoppings, garagens de crossfit, glocks, leds, becos mijados e torres de telefonia — “neomoinhos de vento”.
O balão guarda em si a essência do que somos e a eleva de nós, em segurança, como quem suspende uma criança diante de um cão raivoso solto na rua. Fica no céu, exposto. A altura permite que seja visto e admirado de muito longe, por muita gente. Poucos fios o sustentam. Muitas mãos corajosas nos poucos fios. As de Flávio, com duas voltas no pulso, estão entre elas.
Neste seu Minério de ferro, Flávio, com a camisa do Timão de 77, invade a live e arranca da parede, a tapas, a estante de livros-cenário da verborreia pequeno-burguesa dizendo: — Literatura deve ficar no chão. No rés do chão aos pés do povo!
É ali que ele atua feito estaca no peito dos vampiros que tocam o lúgubre projeto de escuridão que traçaram para nossas vidas.
Nesta estaca, com duas voltas no pulso, os fios que sustentam nossa lucidez, nossa sanidade.
Douglas Germano