Houve dias de humanidade em mim

Disponibilidade: Brasil

quando a hecatombe acabar
restará o grito mudo gravado nas paredes dos muros
(os muros sobreviverão)
e alguns ossos espalhados sobre o chão

não restarão sinapses humanas
não restarão códigos binários
tampouco os livros de autoajuda
ou toda nossa religião

quando a hecatombe acabar
centopeias andarão livres sobre o húmus dos nossos corpos
e cabras selvagens comerão nossas fotografias
onde ainda sorríamos a felicidade do sonho

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_sobre este livro

“estar aqui nesta vitrine, exposto/com o corpo dissecado”. Estes são os primeiros versos do poema n.º 2 de Houve dias de humanidade em mim. E se são eles que escolho ao iniciar este texto é porque me oferecem uma imagem muito nítida para dizer algo sobre o novo livro de Viegas Fernandes da Costa. Os vinte poemas, a explicação desnecessária e “(o poema que não coube na conta)” que constituem o livro são a oportunidade de vivenciar uma dissecação anatômica dupla. Em um plano, corajosamente, Viegas oferece seu próprio corpo como matéria poética exposta e disponível para ser observada e estudada. O corpo ainda menino que caminhava no mercado, “a pergunta/queimando na boca”; o corpo adulto que na noite mais escura banhou sua nudez na água fria da nascente. É o corpo, suas geografias e memórias que se oferece em paisagens compostas, na mesma medida, por prazer e dor, revolta e nostalgia.

Em outro plano, é a cidade que se torna corpo a ser explorado, anatomizado. Não qualquer cidade, mas sim a cidade de “Desterro” (também conhecida como Florianópolis). São vários os poemas em que Viegas nos oferece as entranhas da cidade, seus órgãos e tecidos. Suas precariedades, aquilo que se move nas sombras, nas vielas. O cotidiano e suas dores. Sempre sob o olhar cuidadoso e gestos minuciosos de um anatomista-artesão das palavras. Atento e de cortante lucidez. É assim que surge uma poesia que “carrega a sujeira das ruas, a sujeira dos tempos presentes/a palavra colhida do lixo, o poema impresso em papel de jornal”.

Corpo: é disso que se faz Houve dias de humanidade em mim. Ser um corpo atravessado por toda a brutalidade do presente, esbarrando cotidianamente nas misérias do corpo da cidade para, por fim, tornar isso tudo linguagem poética no corpo das palavras, dos poemas e oferecer um convite a caminhar de mãos dadas. Porque afinal, é disso que se faz a poesia.

Eduardo Silveira

Escritor e professor. Autor dos livros Mirabile plantae (2023) e O Senhor Toshiaki (2018).

_outras informações

isbn: 978-65-5900-826-1
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 13x16,5 cm
páginas: 56 páginas
papel polén 90g
ano de edição: 2024
edição: 1ª

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