“A poesia é um dos destinos da palavra”, diz Gaston Bachelard. Mas se depender de Bárbara, a poesia também vai ser o ponto de partida. Não existe chegar, neste livro de estreia. Aqui as palavras correm soltas, caem, mas não caem estáticas para criar raízes. Pelo menos não em um primeiro momento. Elas caem como pequenas sementes, sementes invisíveis, cuja intenção é voar livremente por aí até encontrar a condição ideal para brotar, que pode ser uma dança de coqueiros ou um trio mágico feito de mim, que escrevo esse texto, tu que vai mergulhar neste livro e ela, a poeta que abre portas para nós. Mas abre as portas de quê? Como um devaneio, a poeta desenha um pouco dessa resposta, dizendo: “gosto do cheiro de chuva quando bate no mato. Esse é o aroma que deve existir dentro de mim”. Dentro de Bárbara tem muitas, tem principalmente Babi, essa artista curiosa, errante, em eterno movimento, que se entrega ao ciclo do mundo com uma fome e uma sede, e principalmente, uma coragem que vai inspirar quem chegar nessas páginas. Nas poesias que formam esse belíssimo livro não existe medo de botar os pés nas águas e, por vezes, até se afundar. Um livro brincante, que por vezes lembra Manoel de Barros, com seu quintal maior que o mundo. Bárbara Melo também tem um quintal de onde partem insetos, mangueiras e crianças imaginárias que formam, antes mesmo de existirem, memórias que ficarão por toda a eternidade. Como ela mesma escreve no poema uma ideia de morte, a “poeira cobre cada fio branco do meu cabelo, estou embaixo da terra e devo voltar no próximo ano”. A poeta volta e volta, passeia pelo Recife, pelo Largo do Machado, mas é na sua casa, no seu jardim, vendo insetos se debatendo na janela, que ela condensa todas e tudo que ela é. Suas palavras bailam, entregam-se em poemas que saltam e abraçam e saltam novamente, dela para nós, de nós para o mundo. “A escrita revela minhas muitas vontades de ser outra pessoa. Mundos que posso habitar sem nunca ter ido, visto, tocado e vestido”. E enquanto Bárbara sacia seu desejo de pluralidade, nós, leitores desses poemas, embarcamos com ela nesse mar formado por todas as palavras que ela, livre e bravamente, soltou.
Marília Valengo