Arranjos vazios para letras cheias

Disponibilidade: Brasil

A nota acesa na ponta em brasa
sumia no apartamento e em nosso silêncio
aquela nota eu não poderia esconder
minha voz não soava em nenhum acorde


Eram permitidas as frases
que não morressem queimadas:
o que agride o corpo, vive o corpo


Desistimos um pouco
quando acendemos esse cigarro
quando emito uma nota dissonante

R$45,00

_sobre este livro

Em 1996, Wislawa Szymborska recebeu o Nobel da Literatura. No discurso de premiação, a polonesa falou sobre o trabalho dos poetas como um processo aparentemente não fotogênico. Szymborska nos convida a imaginar a cena de um documentário que tem como personagem principal alguém que escreve poemas. Uma pessoa caminha pela casa. Senta-se numa mesa. Durante vários minutos, olha o papel. Depois de um tempo, escreve alguns versos e logo apaga
o que escreveu. Volta a caminhar pelos cômodos, retira um livro da estante. Retorna para sua mesa de trabalho ou deita-se no sofá, onde permanece observando as sombras projetadas na parede. Aparentemente nada acontece. Mas o poeta está incansavelmente trabalhando.

Ao ler o livro da mineira Clara Delgado, percebemos essa mesma deambulação, aparentemente silenciosa e discreta, entre a escrita e os acontecimentos do corpo, da casa e do amor. Em arranjos vazios para letras cheias, o elo entre a subjetividade da poeta e o compasso da vida é examinado como se o poema fosse uma ressonância magnética, onde sons se transfiguram em imagens, imagens em palavras, palavras em máquinas de teletransporte e outros instrumentos que nos permitem ouvir, sentir e ver aquilo que aparentemente não percebemos. Arranjos vazios para letras cheias não se parece com um livro de estreia. Acredito que muitas escritoras ensaiam a forma poema em cadernos, bilhetes de amor e outros arquivos secretos. Clara, no entanto, atravessou a fronteira entre a vida privada do verso e sua forma pública há algum tempo. Além de poeta é compositora. Alguém que sabe que canção e poema compartilham o mesmo encantamento pelo pulsar cintilante das palavras. Essa espécie de energia vital que constitui tudo que é vivo. Por isso, seu livro é uma espécie de investigação sobre as oscilações do mundo, no qual o barulhismo do cotidiano é, simultaneamente, silêncio e cadência, explosão e deglutição, rima e metáfora, tremor dos corpos e das águas, tapa de luva e susto. Esquecidos que andamos da relação íntima entre nós e o mundo, arranjos vazios para letras cheias nos convida a inventar unidades de medida para mapear os variados e múltiplos ritmos que nos cercam, especialmente daquilo que é pequeno e invisível como a relva ouriçada de um braço ou o som de uma língua estrangeira. A poesia de Clara Delgado é um presente para nossos sentidos, bastante adoecidos e cansados, de tantos vazios.

 

Flávia Péret

_outras informações

isbn: 978-65-5900-276-4
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 14x19,5cm
páginas: 64 páginas
papel polén 90g
ano de edição: 2022
edição: 1ª

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