_sobre este livro
Então é isso. É tudo um precipício. Entrar ali, ver o palco vazio, as luzes, o silêncio, dei-xar meu corpo boiar ali é um precipício, saca? Eu tive um mestre fudido que falava que tudo, tipo a gente, esse trem, uma maçã na mesa, um pedaço de carne, sei lá, uma planta, um bicho, qualquer coisa, é um precipício, saca? E precipício é queda pura. Isto aqui, ó, na minha mão, tá vendo, moedas de cinquenta e dez centavos. Queda. Overfall.
Ele falava. É inglês mesmo. Overfall isto é um precipício. Saca? Foda pra caralho. A vida é isso aí, uma porra de um precipício cheio de precipícios. E quando você chega na bagaça, é foda. Eu, por exemplo, amarro o cardaço assim, ó, dois lacinhos, que é o jeito que eu aprendi na creche com quatro anos. E ponho os lacinhos pra dentro do tênis até hoje também, porque eu usava um all-star vermelho e punha pra dentro os lacinhos, saca?
Então é isso. Tá na gente. É tipo memória, mas é mais que isso. É gordura. A gordura das coisas. Por isso que não dá pra ficar nessa história de tirar as gorduras das coisas, porque a gordura é essencial. É exaustivo pra caralho também, porque é muita coisa acumulada, saca? Sério mesmo. A gordura é o sedimento de tudo, sem ela, não tem nada. Foda. Mas é isso. Não dá pra querer ser de plástico, saca? Deus, por exemplo. Até deus agora é de plástico. Caralho, deus é gente, porra. Esqueceram disso até. Hoje deus e tudo mais aqui é plástico, saca? E hoje em dia o problema é que ninguém quer olhar pra si, todo mundo quer ser chapado, saca, planifcado que nem plástico. Gente é gordura, saca? Deus é gordo pra caralho, pode botá fé. Deus é gordo pra caralho.