a fumaça fica presa entre meus dois dedos primários
esta noite sonhei com a sujeira nas camas do hospital
eu deveria limpar sem constrangimento
afirmo meu batismo e isso pode ser o amor
ou pode ser a continuação do sonho
o princípio do sonho ou a sua base
tomo o desígnio e abro o toque
limpo as camas com perfeição
os meus dedos adulteram a cena
minha cara se transforma no vermelho
R$48,00
_sobre este livro
Porto, dezembro de 2018.
Izabela bebia mais um café, observando contrariada o punhado de folhas que eu recém jogara na mesa do escritório. Era o arquivo digitado com a reunião de todos os seus poemas, até então espalhados e negligenciados: o embrião deste livro. Não me parecia justa a ideia de ser privado o deleite poético frente à sua obra. A escrita que toca sua condição humana e sabe dizer sobre isso: “brigo com você pela náusea/brigo com você porque quero quebrar a engrenagem/brigo com você porque não quero quebrar a engrenagem”.
O que intento fazer como apresentação deste é mostrar ao leitor que os escritos aqui publicados são um meio para chegar até a autora. A identificação da arte produzida com a pessoa de Izabela sempre me pareceu grandiosa e urgente de ser comunicada, porque sua vida é genuinamente um gesto estético. O que eu poderia fazer além de me comover com a verossimilhança? As notas de sua poesia — os tempos das esquinas, as paisagens inóspitas, a ternura e também a dureza — são as notas de seu espírito. Ambas têm cheiro de coragem, crueza e retidão.
Belo é não encobrir a vida com dissimulações. Izabela possui dedos frágeis demais para tanger o real sem mediações, mas ainda assim o faz. Como deixa que o gozo escorra pela boca e se transforme em voz ativa? Como maneja olhar para o cansaço das horas e, justamente por isso, acredita na rotina? Como sempre imprime crianças a constranger generais? Por que não titubeia? Por que, quando desaba, produz força para ressurgir e levantar junto de si seus irmãos? E, o mais incompreensível, como opera a destruição de toda a vil moralidade dominante e, ao mesmo tempo, projeta sobre sua cabeça o imperativo categórico que comanda cada uma de suas ações?
Outro dia, revisitando seus registros, escrevi: “Como se tivesse o mar nas mãos”. Mas o que isso poderia significar? Certamente algo sobre a liberdade.
Isabelle Cruz
_outras informações
isbn: 978-65-5900-738-7
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 13x16,5cm
páginas: 68 páginas
papel polén 90g
ano de edição: 2024
edição: 1ª