aqueles post-its colados no computador ou na geladeira com lembretes, aqueles lembretes sem contexto no bloco de notas do celular, aquele papelzinho que a gente rabisca enquanto fala ao telefone. os poemas reunidos neste livro são como essas palavras e imagens miúdas, alguma coisa que surge na despretensão. e é justo na modéstia onde se encontra a verdade mais íntima das coisas. a eloquência mora na simplicidade radical da vida. por isso são como portinhas, uma passagem, um quase-lá: parece que insinuam algo maior, e se propagam, precisamente, no vazio da página, na falta de mais detalhes. mas a inteligência destes poemas é também querer dizer exatamente o que dizem — sem mensagens criptografadas, sem teses filosóficas. é a palavra que fala de modo direto e reto à experiência: afinal, todo mundo pode se conectar com ditos sobre o amor e o desamor, sobre o fracasso, a preguiça, a tragicidade.
como num fluxo de pensamentos, um devaneio inofensivo é seguido por uma constatação existencial, que é seguida por uma reflexão objetiva da realidade, que é seguida por uma observação tenra ou desagradável sobre algum aspecto da vida. a menor das coisas está indiscutivelmente ligada à maior das coisas. e é a forma orgânica desse movimento que dá grandeza a estas palavras. é também por isso que cada um destes poemas precisa do poema seguinte e do poema anterior para ser grande. os poemas conversam entre si, mudando ou expandindo o sentido que se havia dado a um bocado de palavras anteriormente. elas brincam, nos enganam e nos reafirmam.
tudo isso com a presença de espírito de alguém que não se leva tão a sério — noah comenta o trágico com humor. não aquele humor que esconde uma lama de subjetividade embolada, mal resolvida, mas uma predisposição em não se deixar abater pelos chutes da vida. nada é o fim do mundo, mesmo quando é. tenho a impressão de que noah compartilha conosco as anotações que fez para si em dias de mormaço, quando o calor nos convida violentamente a ser sucintos (num dia de muito sol, até a palavra tem preguiça de se dizer). então falamos pouco — falamos o essencial, registramos apenas o core da mensagem e pensamos: “depois eu volto a isso”, “mais tarde desenvolvo isso melhor”. e, quando voltamos a essas anotações, ou elas não fazem sentido nenhum ou já fazem todo o sentido e não precisam que nada mais as explique — está ali o conteúdo bruto da mensagem. simples, urgente, explícito, inequívoco. assim é delito delírio deleite.
thaysa paulo