Te vejo me vejo é um livro sobre o começo de tudo.
E o começo de tudo não é o big-bang, apesar de a autora também afirmar que um filho é a própria expansão do universo.
Te vejo me vejo é o título de um de seus contos, escrito pra Caetano, o filho mais velho e, no entanto, é também uma constatação do leitor que, sendo ou não mãe, se reconhece na humanidade escancarada de Flora, que escreve porque precisa dar vazão ao que sente.
As coisas têm o tamanho que a gente dá pra elas. Flora tem lente de aumento nos sentidos. Escreve com o corpo todo: pele e entranhas, cabeça e costas. Faz desse livro uma bacia de água onde desemboca dores, encantamentos e dúvidas. Fala do espelho entre mãe e filho e também do espelho entre mães e mães.
A leitura é um passeio visceral pelo universo da autora, que registra a sensível, assustadora e brilhante rotina que se passa dentro e fora de seu corpo com a chegada de seus filhos. É como ler um diário de um estranho profundamente íntimo. Um livro de desabafos e celebrações.
Flora se diz pessimista ao mesmo tempo que é uma das pessoas que conheço que mais acredita que o afeto verdadeiro é o único desengano, a grande forma de encontro e pertencimento.
Afiada, captura belezas e dores. Contorna o caos com delicadeza e humor.
Brasileira, foi capaz de criar seus filhos e novas raízes distante de seu país.
E ainda que a origem primeira desses relatos seja a necessidade de se expressar, acabou por costurar momentos extraordinários do cotidiano que agora podem ser partilhados com tantos outros oceanos. Ainda bem!
São contos de suas vivências diárias sob o olhar encantado e exausto de uma mãe.
Registros do que se passa na mente e corpo de um ser humano que é capaz de gerar outros.
Tereza Monnerat