O livro fúcsia — da linguagem tripartida, segundo livro do escritor e tradutor gaúcho Diogo da Costa Rufatto, é um trabalho ímpar. Não, isso não é um clichê! Tampouco uma muleta para começar este texto. Isso é um fato. Porque a palavra ímpar, aqui, não quer dizer apenas uma singularidade específica — embora isso também exista no livro: singularidades —, mas sim uma forma de divisão que está nas coisas do mundo, na linguagem, na natureza, nos corpos, nos medos, nos livros que Diogo leu — fluxo e floema — do seu próprio texto, forma essa que não é apenas binária, mas um pouco mais múltipla.
Neste livro de três histórias autônomas, porém complementares, o autor nos apresenta uma espécie de santíssima trindade do eu: três personagens em busca de uma linguagem que lhes dê existência. Em “Eu. O vento. A coisa”, primeira história deste livro ímpar, acompanhamos a constituição de uma mulher, uma mulher velha, abandonada em uma casa de repouso, esquecida, enfrentando sozinha o processo de se (re)conhecer: “como se vive?”
A história que se segue, “Língua paterna”, nos conta sobre a vida de um homem “resiliente, sério e forte”, como costumam ser alguns homens. Um homem que não conhece a linguagem dos afetos até que…
A última história deste livro tripartido, “HLH”, nos apresenta um triângulo amoroso intertextual, que convida o leitor a entrar no campo da linguagem e — no gozo — perder a palavra, a linguagem, o limite, escapar…
Diogo da Costa Rufatto escreve com lascívia, sua escrita é sensual e substantiva, nomeia cada coisa até extrair dela sua medula óssea, seu cerne, sua infinita potência semântica. Tradicionalmente, essa artesania é mais comum na poesia do que na prosa e é nesse limite — entre a narrativa e o verso — que este livro impõe sua beleza. Eu não sei dizer se os livros precisam nos ensinar coisas sobre a vida — amar, resistir, libertar-se. Talvez. Os bons livros, como é o caso de O livro fúcsia – da linguagem tripartida, nos ensinam que a incerteza, a desobediência e a insensatez são também formas — encarnações — da lucidez.
Flávia Péret