O céu era uma nata pingando

Disponibilidade: Brasil

meu amor há sim
mofo e água pra raspar
pelas omoplatas

R$48,00

_sobre este livro

Uma das entradas para visualizar os muitos gestos da poesia brasileira contemporânea é entender não só como os autores trabalham a linguagem, mas também quais referências são convocadas para a criação de determinada obra. Em o céu era uma nata pingando, livro de estreia de Pedro Willgner, o diálogo com diversas vozes poéticas e outras expressões artísticas e filosóficas nos mostra um autor atento a produções recentes, não apenas no intuito de reverenciá-las, mas de instaurar uma diferença a partir de recortes singulares. Quer na escolha das epígrafes de João Cabral de Melo Neto e Maria Lucia Alvim, quer na alusão aos céus do cineasta Akira Kurosawa, há todo um “eixo de inspirações e referências” a que Willgner recorre para criar seus próprios frames. O resultado é um movimento de imagens que vai da amplidão sideral ao espaço íntimo da casa, sempre rememorado com estranha delicadeza.

Na primeira parte, homônima ao título do livro, alguns poemas são marcados por datas, outros por espaços e objetos do lar que, aos poucos, vão se insinuando com cores, cheiros, texturas, assim como se revelando em inquietas incrustações nas coisas mais comezinhas: “foi com essa idade (…) que começou a contar a morte na sua casa”. Sobrevive aos estilhaços da memória a presença da mãe e da irmã, de signos cristãos como vestes, versículos e santos, assim como de uma terceira pessoa com quem se compartilha “a nata pingando” ou a “nata / fina e nojenta” cuja cor contrasta com os muitos elementos em azul para além do céu: inscrições, mensagens, facas, azulejos portugueses. Isso vai construindo uma espécie de promessa, feita pelo enunciador, de um dia produzir um “tratado sobre as natas” a partir de imagens de um lar tomado pelos “modos brancos de um testemunho”, pelos “segredos dos bordados” e pelo silêncio cúmplice. Há também uma atmosfera tensa “no que há de mais fatal / ao abrir a boca”, que culmina, à guisa dos palimpsestos, na revelação de que o esforço mnemônico do eu-poético “é trabalho de bicho triste”.

Na segunda parte, intitulada “o que acontecerá às circunstâncias quando acabarem todas as goelas?”, o leitor encontrará poemas que se permitem, ao menos por algum instante, sair de casa e falar sobre o amor e o sexo por meio de perspectivas incomuns, como a da eletrostática (a exemplo de Marília Garcia) e da síndrome do coração partido ou cardiomiopatia de takotsubo. O homoerotismo, não sem alguma “dor de cotovelo”, opera sem grandes interdições e tudo agora desce “com o dobro de mucosa” até criar “nós nas amígdalas”. Como se o procedimento fosse raspar o íntimo para doar ou doer silêncios, ou ainda para mostrar alguns vícios, Pedro Willgner talvez deixe o tratado sobre as natas à espera de realização em proveito de uma outra coisa. Com o céu era uma nata pingando ele faz soar aos nossos ouvidos essas tantas sugestões e perguntas a respeito do encontro de corpos que se desejam e se repelem.

Edmon Neto, poeta

_outras informações

isbn: 978-65-5900-736-3
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 13x16,5cm
páginas: 68 páginas
papel polén 90g
ano de edição: 2024
edição: 1ª

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