_sobre este livro
Para existir, capturar poesias. É isto o que sinto quando leio os poemas da Nayara, que experimenta a vida com um olhar estrangeiro e uma “faca na garganta”.
Nos nós dos seus versos, a cidade flui com seu concreto, seu asfalto, sua velocidade e sua solidão. Mas a frieza do presente não impede que o furor de um outro tempo atravesse a consciência e o olhar. Então, os versos são tragados pela memória de uma infância sem muros, de um tempo povoado por mais esperança e afetos. Assim, diante do caos da vida cotidiana, Nayara para o tempo e captura poesias no improvável.
Não pense que capturar poesia é um gesto harmônico ou neutro, pelo contrário, é um ato político e, portanto, grita, assola, desassossega. Um ato político convoca o corpo a posicionar-se diante do mundo.
Fazer versos como modo de sentir e compreender é uma tarefa de entrega e resistência. Entrega a este sentimento de despertencimento em relação ao próprio corpo, à própria terra e ao próprio tempo. Resistência à lógica capitalista que devasta e emudece, que endurece o mundo e os afetos, que despreza o que é belo, vário e outro.
E Nayara não teme, nesta tarefa, o desmoronamento da palavra. Esta mulher, em construção diante da melancolia, do derretimento dos laços, da terra devastada, do desprezo ao diferente, mobiliza palavras em um movimento que a enlaça no espelho do outro e, ao mesmo tempo, a singulariza.
Enfim, é preciso estar junto, ser comum, para descobrir-se único, eis a tarefa desta poesia: Nayara C. P. Valle
“Quando saímos
de dentro da gente
é que nascemos
Tocar dentro do outro
feito ponte iluminada
irmana nossos abismos”
Juliana Teixeira