Pena pele pelve
escrevo entre mares
a contrapelo
trans-lúdica opacidade
incandescente
e à margem:
nu(l)a alteridade.
(Do Mar Egeu
ao Jalapão,
a mesma
soberana lua
sobre o que
não tem
explicação.)
[Lume, página 9]
R$50,00
_sobre este livro
(Em) lume bravo, livro que estreia a poesia de Isabella Faustino, toda matéria poética se ergue sobre um risco. Não somente o risco do confronto, multifacetado na sua experiência imigrante, na sua bússola nortista, na sua assertiva feminista ou, sobretudo, no senso de justiça que costura com dor e ironia as linhas de força desta obra. Trata-se também de um risco da linguagem, que ora se camufla na hipnose rítmica, verbo-imagética ou idiomática das palavras, ora se desembainha seca e arremata um poema como quem explode uma estrela. Do começo ao fim, a progressão do plano temático nos orienta por um movimento espacial gradativo e imersivo. O primeiro segmento — assim o chamemos — estende-se por largos traços em uma geografia colonial, cujo centro de gravidade são as tensões entre um certo imperialismo linguístico-cultural e a “ilusofonia”, sempre forjadas na incapacidade de assimilação das diferenças entre o local e o alheio. Tal voz, predominantemente direta, desembocará em poemas como “Rubra”, de interrogação biográfica sobre sua vivência em Coimbra e os expressivos sintomas de uma tradição decadente: “submerjo (em) tua noite/como se eu mesma fosse/a própria voz de mulher/que falta no teu fado”. Como um contrapeso, essa ansiedade do reconhecimento irá ser suspensa ao evocar como uma memória idílica a paisagem da cidade de Palmas. Aqui, a luminosidade oratória das imagens projetadas irá friccionar com os limites da representação, dissolvendo em contornos imprecisos ou até inatingíveis a dimensão do seu horizonte: “é olhar de soslaio/espalmado/de quem, sob a luz,/vê o mundo para além/de seu fim”. Em paralelo, esse retorno a Palmas se demarca como um divisor de águas do livro, desdobrando-se adiante em um novo percurso pessoal, não mais delineado pela (des)territorialização da identidade, mas agora pela reivindicação de uma individualidade ética, tanto sublinhada pelo tema da justiça, quanto pela luta pela liberdade do corpo feminino. Por fim, essa imersão encontrará na metalinguagem uma última etapa produtiva ou um retorno essencial desfreado por um plural de vozes. Sobretudo, ao adentrarmos pelo itinerário poético de (Em) lume bravo, defrontamo-nos com a notável perspicácia de Isabella Faustino em extrair de uma consciência coletiva (e histórica) não somente o espelho de um amargo cotidiano, mas uma metáfora da criação de uma saída possível como uma condição literária: “Era vontade de usar a língua:/a portuguesa/e a própria”.
Daniel Cruz
professor, produtor cultural, escritor e mestre e doutor em Literatura pela Universidade de Coimbra.
_outras informações
isbn: 978-65-5900-690-8
poesia portuguesa
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 13x16,5 cm
páginas: 76 páginas
papel polén 90g
ano de edição: 2024
edição: 1ª