Desde Nverso [2020] vimos despontar a poesia de Thiago Hoshino, e pareceu óbvio que de seu percurso brilhante um dia iria emergir esses versos com a força com a qual Hoshino dedica-se sempre à vida. A vida aqui, entenda-se, como uma soma de re-vivências que se apresentam no dia a dia como sensibilidade e potência em processo, para saudar a existência, para recriar a experiência do tempo, que em seus poemas ele ressignifica.
Cada traço-caminho abrange /um mapa de andarilhar/e esse mapa é o modo com que Thiago Hoshino andarilha por esse tempo. Caminho-memória, dádiva e gratidão que se desenlinham da própria história que o cerca, mapa riscado pela presença ancestral de casas, árvores, seres mágicos, folhas, pessoas. A ancestralidade jorra de um futuro que se desenha no passado, e é nesse passado que a poesia de Thiago engendra sons, aromas, cantos, vozes e cores. A recorrência à ideia de alma antiga, alma mater primordial, alimenta a poesia de Thiago.
Aqui, agora, com Descolônias, iluminado pelos desenhos de Nelson Sebastião, o tempo se arvora nessa ancestralidade: Naquele tempo/nem sequer havia galos/ para as manhãs,/nem para coser venturas/as tecelãs./nesse desfiar contínuo e silencioso, para em seguida jorrar em vozes femininas e míticas: Nossos acordes/são a voz das lavadeiras/e das sereias. A visão se espraia em todas as direções, o horizonte se mostra próximo e as vozes de um infindável tempo sussurram: Foi a poeira/meu oráculo tardio/que não renego/e por toda parte o escombro/e a ribanceira/até onde alcançam as vistas.
Quanto a nós, leitores, nos aproximamos, cúmplices que nos tornamos. E o mais é exatamente a cumplicidade desse mergulho profundo na poesia de Thiago Hoshino.
Jussara Salazar