Como se a gente conseguisse medir o tamanho do escuro

Disponibilidade: Brasil

ligo pra minha mãe
aos domingos sei quando ela chega da igreja
é hora do café mas tomo chá
com mel disfarço a voz da noite
passada embriagada
esfumaçada depois dos pesadelos

R$45,00

_sobre este livro

O escuro não medimos por fita métrica, por palmos, por passos, por computador e, é claro, nunca de olho.
No máximo, caminhamos às cegas à procura, esquecemos o quanto andamos, voltamos atrás, encontramos um obstáculo. A empreitada é inútil. O breu é sempre infinito e não há um parâmetro que diga se acaba cinco centímetros além dos nossos narizes, se dura mais um quilômetro ou se está mesmo no corpo. É esse o espaço investigado neste livro: “os travesseiros não boiam afundam no escuro/é noite de ondas negras/pela fresta água entra pelas veias íntimas do casco”. A tarefa não é só inútil, é também impossível. Mas Constança Guimarães lança a hipótese e escreve com as pálpebras apertadas, como se fosse deparar-se com uma parede a qualquer momento.
Se fosse possível, essa seria uma investigação sobre o susto, sobre o medo, sobre aquilo que arranha, que faz sons insuportáveis ao nosso corpo, sobre o desejo que atinge a beira e se transforma em outra coisa. Se fosse possível medir o tamanho da escuridão, seria uma medida de distância? De volume? De área? Qual a medida correta? Centímetros, pés, palmos, metros, quilômetros, milhas? O terror? Ou os olhos atentos de vidro de um felino noturno?
A escuridão deste livro pode ser a memória, o passado, uma viagem ao fim do mundo, o café preto que se repete, um medo muito grande: “todo dia eu tomo um/às dezenove horas/em ponto risco o passado/marco o novo número”. Pode ser ainda a falta inútil e que cultivada não acaba: “guardo sempre comigo uma caixa/ riscada que nunca/fica vazia”. A cama range, as alegrias são ralas e a madrugada insone termina com o som do cachorro arranhando o papelão. Mas é aí também que uma onça avança, abre as janelas, desafia. A preservar o algodão, prefere deixar as janelas escancaradas. Na dúvida, ocupa a cama inteira e dorme de viés. Esperará o dia do pagamento para sumir de vez. Quem mede o escuro é a mulher, é a mãe que não sabe aonde vai e ainda assim guia, que não se ouve, mas às vezes canta escondida no quintal: “ninguém de nós sabia pra onde/mas a gente ia grudado/nela que ia grudada em nada era o que/a gente pensava/ miúdo calado […] a mãe chegou sozinha/onde estamos hoje bem”. É a mulher miúda que o poema nunca ouviu. Quem mede é Constança Guimarães, com voz grande, olhar agudo e uma gargalhada sonora. Quase uma bruxa. Não somos? Mas o leitor pode ler tranquilo. Amanhece. A fissura é escondida. “Lá/onde não há moldura onde eu possa estar/estou”.

Eliza Caetano

_outras informações

isbn: 978-65-87076-80-5
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 14x19,5 cm
páginas: 122 páginas
papel: couchê 115g
ano de edição: 2021
edição: 1ª

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