Nossa senhora dos cordões: é assim que chama aquela que amarra caminhos, costura tempos, entrelaça palavras? Eu
não sei, mas peço bença pra pisar devagarinho nesse trançado em que lá e aqui ora se juntam, ora se afastam. Nos intervalos entre um bloco e outro, a poeta organiza o carnaval. É carnaval! É benzimento isso que se faz na mistura, ou é o feitiço da ondulosa? Porque a receita pode levar vários nomes: colagem, montagem, sampler, citação, afeto, apropriação, macumba. Também, por que não? “Não tenho nada a dizer. Somente mostrar. Não vou roubar nada de precioso nem me apropriar de fórmulas espirituosas. Mas sim, dos arranjos, dos restos: não quero fazer o inventário disso, mas permitir-lhes obter justiça da única maneira possível: utilizando-os”. Peço a bença também a Benjamin, saúdo a ancestralidade e sopro a palavra: Juliana Pithon estreia na literatura fazendo corpo, fazendo mediação de acontecimento. Corpo médium meio baiano meio paulistano. Ela poeta serpenteia no terreiro. E não faz corpo sozinha. Maria Carolina Marchi segue cambonando poesia: ilustrando, mostrando, demonstrando. Criando imagens do tempo-monstro que engole a si mesmo regurgitando novos sentidos: antropofagia, tropicália, a treva do agora, governo e desgoverno, baile funk, transe, transa, tudo entregue no centro da gira, rodopia poemapoesia e teatro de impossíveis. Porque o desejo é a ativação de novos mundos.
Entremundos: entidades encarnadas e desencarnadas, guitarras-elétricas e orixás. Intermundos: arte, política e ética: bateria-corpo-instrumento é / ritmo dança movimento / no palácio / no carro / no portão / que se abrem / para o ato de renúncia: Banana feijão é isso: um corpo aberto. Por isso, generoso. É poesimagem que convida à participação porque não subestima a leitura. Muito pelo contrário, giro pensamental: corpo de fé esse livro que esperanceia que outre também saiba trançar o interrompido, que possa continuar a criação. Porque é na interrupção – dos versos, das histórias, da História – seu ato político-poético e procedimento filosófico: “o que as práticas de apropriação operam como diferença é justamente a mudança da leitura como autoria implícita para uma autoria explícita” (Villa-Forte). E é bonito isso de ver a palavra incorporando, a ideia virando força, a paixão despenteada rindo largo com o copo na mão… salve a corpa que carrega e faz falar o que não pode calar! Tomara disse nada: [spoiler é coisa de narrativa frágil, portanto]
Geruza Zelnys