Mariana Queiroz tem o dom de colecionar palavras, conduzi-las ao limite da sensibilidade e da expressão de uma revelação, que não contém propriamente segredos, mas é difícil de trazer à luz, pois requer a intenção da queda livre, da exposição, de marcar território. Desta vontade férrea, que vai lapidando caminhos e um estilo, brota o ato desafiador do escrever, do poetizar. Isso, Mariana tem de sobra.
Assim, desbrava a poesia, tornando a palavra em corpo, e o corpo em um instrumento poético. Como uma colecionadora, sabe escolher a palavra mais certeira (aqui, uma beleza de alicerce crítico), como se decodificasse, aclarasse o existir, em um particular modo de investigar o que, para muitos, é insondável: a materialidade da vida, a consciência e o poder da resistência. Um “eu” mulher que resiste e convoca suas aliadas à luta. Seus versos capturam instantes do cotidiano, porém, trazem o que há de sublime nele, assim como a necessidade de rupturas e as indignações diárias, que não descansam, pois o patriarcado insiste em não permitir.
A melhor maneira de resistir surge no apresentar, desdobrar e doar a poesia, com inquietante sutileza, à missão de imprimir uma voz feminina que já se cansou dos silenciamentos. O silêncio bem-vindo é só aquilo que o poema deixou de contemplar como impossível de ser dito e permanece à margem ou nas entrelinhas. Em Avoa, muito foi dito, há vivências, recortes e convergências, que desnudam a condição da mulher neste tempo de fascismos que desejam tornar os universos femininos um campo de batalha, um reino a ser conquistado e submetido.
Em um cenário perverso, assumir-se, gritar a própria identidade é o auge das estratégias de resistência. A poesia de Mariana Queiroz diz com todas as letras o que é o amor, o que é uma mulher amar outra mulher: os afetos, o corpo e a natureza, todos os elementos que nos aquecem, protegem-nos e nos fazem sentir vivos.
Avoa é um livro dividido em eixos, contemplando sentimentos, perigos e a beleza de ser mulher, contundo, ao promover a fascinação pelo desassossego e o empoderamento de quem precisa lutar cotidianamente, revela-nos a experiência humana dos afetos, para amar, congregar e sobreviver.
Wuldson Marcelo