O Brasil não é para amadores, disse Tom Jobim. Nem para fracos, acrescento eu. Afinal, são tantas emoções! Uma hora o Brasil é o país do futuro de Stefan Zweig. Outra hora é um país com um enorme passado pela frente, para citar agora Millôr Fernandes: um passado colonial, escravagista, patriarcal. E cristão. Ontem eram os missionários jesuítas, como José de Anchieta e Antônio Vieira. Hoje, pastores como Malafaia e Edir Macedo. Ah, mas uma coisa permanece a mesma: uma horda de escritores anônimos e frustrados num país que não é conhecido pelo hábito de leitura.
Este é o caso de Pedro, o protagonista dessa narrativa com extensão de novela e fôlego de romance. Contrariando os pais, que preferiam engenharia ou direito, ele optou pelo malfadado caminho das letras. Graduou-se, fez mestrado, publicou um ou outro artigo acadêmico que ninguém leu. E alguns livros de ficção, que granjearam um ou outro leitor e lhe fizeram cócegas no ego. No entanto, hoje, cinquentão, faminto, Pedro sobrevive desfazendo-se dos exemplares de sua biblioteca nos sebos da cidade e de uma ou outra oficina de escrita criativa, pois, todo mundo, ainda que não leia, quer ser escritor. Pedro não acredita muito no que faz, e seus alunos mais inteligentes também não.
Um belo dia, convidado por um conhecido, Pedro vai visitar uma dessas igreja que transmitem a mesma mensagem moralista numa roupagem jovem e descolada. Pedro se torna um pastor promissor — ainda que sem fé, pois a fé é um quesito dispensável nessas igrejas. Assim, em meio a carreiras de cocaína, vinhos uruguaios e frases de autoajuda , Amém, miséria é um retrato fiel, pelas lentes da galhofa de um Brasil que tem tudo para dar certo, mas prefere flertar com o abismo. Leitura recomendada para aqueles que desejam uma luz no fim do túnel — e que não seja o trem vindo. Com efeito, toda distopia aponta para vestígios de utopia. E é esta que buscamos, como um negativo fotográfico, nas frinchas da obra de Marcelo Alcaraz.
Otto Leopoldo Winck