Este livro é composto de poemas em alta voltagem. Mesmo que de início pareçam sóbrios, mansos, singelos até, há neles uma energia capaz de abalar crenças, destruir convicções, desnudar todas nossas fragilidades. A dura, a excessiva realidade cotidiana, ceifadora de sonhos infantis.
O entendimento — melhor, não o entendimento, mas a vivência do mundo — evidencia a impossibilidade da compreensão total do outro e a inviabilidade da exposição total de si. E então os desgastes nas relações, e as dores daí nascidas.
Os poemas estão repletos de certeiras, sofisticadas e sensíveis imagens poéticas. Que não são discricionárias, surgem essenciais para que a percepção do íntimo se dê. E há também as palavras duras, de pedra, necessárias para a exposição das aflições que envolvem o ser, como treva, como sombra, imunes à luz.
O poeta sabe que o absurdo está em nós. Mas que só sofrer não dará luz aos versos. Não adianta chorar. Conhecer o mundo não significa compreendê-lo. A vida é turva. E o mundo é feito de neblinas e sombras, tendo quase sempre, como fonte única de iluminação, a luz dos olhos de alguém.
Há no livro, ainda que tímida, uma crença sincera no amor. Na amada presente, que não se entrega aos fracassos, que não se curva à dor. Não há palavras sem alma. A amada é uma interlocutora em silêncio. Sobre ela se diz, por ela se sofre, se ergue. E sua figura é a imensa presença por toda a poesia surgida. E há ainda o amor pelas coisas inúteis, pelas coisas não percebidas. Não há remorso, não há saudade, é a vida inscrita nos ossos.
Talvez alguns poemas não serão compreendidos na primeira leitura. Mas causarão impacto na primeira leitura. E serão belos na primeira leitura. E convidarão para o aprofundamento, para o pulo no abismo. A fuga da vida é impossível. Não se pode fugir dos labirintos.
Alexandre crê que não há sacralidade alguma nos sentimentos. Todos podem ser crus, desnudos, expostos. E os poemas escavarão corpos, romperão carótidas, cortarão pulsos. A vida não é só a vivida. É a questionada. É a possibilidade que não se deu, ou que foi covardemente recusada. Há uma variedade de vidas que se tornam concretas em versos etéreos, pesados como chumbo.
Adentrar o universo poético de Canções de amor em língua morta é encontrar o estranho e fulgurante qualificar das coisas e das circunstâncias (a incoerência das manhãs, o obtuso sabor das flores, o amarelo intenso de um lá maior). E saber que nem tudo pode ser dito. Há o que existe e é maior que a linguagem.
Lausamar Humberto, poeta