Antes de mais nada, cabe destacar que Rafaela é uma dessas pessoas que parecem miúdas, tímidas, mas que se transformam em uma força da natureza com uma caneta na mão.
Foi assim que conheci seu livro anterior, de contos. Já tem um tempo que vivi essa experiência e não fui capaz de desgrudar de mim essa potência toda que Rafaela coloca em suas histórias. Eram diversas, impossível dizer qual foi a mais bem escrita, qual melhor enredo, narrativa, personagem. Nota 10 no quesito “baita livro bom”.
E um dia chegou esse livro na minha mão. Meu primeiro fascínio com o que recebi foi o fato de Rafaela, uma brasileira, descendente de japoneses que já morou no Japão, apresentar uma família japonesa. Eu, descendente de italianos que nunca morei fora do meu estado natal (RS), percebi de imediato que ali teria algo novo, afinal, tratava-se de uma cultura distante da minha e dependeria quase que totalmente da autora que essa experiência fosse convertida de leitura para uma viagem.
A grande empolgação para o começo dessa jornada era justamente por saber que Rafaela é plenamente capaz de promover essa mudança de estado. Isso não evitou que eu me sentisse confusa logo na largada, porque a autora promove uma quebra de expectativa sobre o protagonismo da história (essa sou eu não querendo dar spoiler).
Então o que temos é uma história contada em dois tempos: o presente, de reencontro e mistérios, e o passado, que vai nos apresentando não apenas essa família japonesa que enfrenta xenofobia por causa da guerra, mas que vive em seu seio grandes conflitos, parte culturais, parte simplesmente humanos.
Narrativas em dois tempos são sempre um risco imenso para o autor, que pode, conforme a técnica usada, tanto subestimar quanto superestimar o leitor. Rafaela ficou exatamente na linha do acerto. As mudanças de tempo são facilmente perceptíveis sem que se escancarem a ponto de interromper o fluxo da narrativa. Isso sem contar, claro, o grande mistério que cerca a irmã mais velha, descortinado de forma quase poética.
Peixes de aquário é uma obra notável e inesquecível, não tenho dúvida de que encantará qualquer um que tiver acesso a ela como me encantou da primeira à última página. Rafaela é uma autora a se prestar atenção; sua narrativa e capacidade de contar boas histórias com certeza ainda nos reservam grandes e gratas surpresas no futuro.
Maya Falks