não sei quantos minutos
são três e dez
quase hora de bater
o sino
quase hora de voltar
no tempo
chacoalhando os ponteiros
recém-conhecidos
mas tia Cátia não ensina nada sobre isso
o relógio só anda pra frente
a mão só anda pra dentro
R$45,00
_sobre este livro
Eu e Paula trocamos cartas de amor há anos. Com ela, descobri que uma mulher nunca escreve sozinha. Construímos uma relação a partir do pequeno gesto de bravura que é tirar um poema da gaveta de calcinhas. Aos poucos, fomos revelando, uma para outra, nossas palavras abafadas. Tirar do armário, pedir licença, ler em voz alta, descobrir que não é preciso pedir licença, ler de novo. Com Paula, descobri que todo encontro de palavras é singular, todo encontro de palavras é ritual. Em Cabra marcada para morrer, a singularidade desse encontro está nas palavras que carregam ideias de fogo — e elas estão, sim, disponíveis para serem deslocadas conforme o manejo poético daquela que se aventurar.
Onde é que a língua torce? Quem falou primeiro? Quem segura o lápis? Paula retorna ao gérmen das estruturas de opressão para encontrar em que ponto a engenharia patriarcal começa a se reproduzir. Em qual bifurcação perdemos a mulher? Qual foi o mito original que aprisionou a deusa? Qual foi a oração que sacralizou o hímen? É no manancial da história que o lirismo de Paula busca embalo para correr solto. É chafurdando a origem das palavras, se perguntando a origem das imagens, recorrendo às fundações, que Paula pinça os símbolos que deseja subverter, preenchendo sua poesia de imagens profanadas e impossíveis.
A metáfora da água como símbolo do feminino também é pervertida nesses versos: a água que corre não é a imagem romantizada da mulher como um rio, mas a imagem da água suja do bueiro obstruído. As águas em Cabra marcada para morrer são as águas poluídas de séculos de repressão e de incessante violação de um ecossistema. Mas a poesia de Paula nos lembra de algo crucial: se essas águas imundas estão confinadas nas tubulações de aço ou de plástico (atrás de todas as paredes de todos os prédios), se essas águas imundas precisam de uma estrutura pesada de ferro para serem contidas (debaixo de todas as avenidas), é nessa contenção que elas também encontrarão força para romper o cimento e o asfalto. E explodir. Paula Dias Conrado
_outras informações
isbn: 978-65-87938-24-0
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 11,5x18cm
páginas: 62 páginas
papel: pólen 90 gramas
ano de edição: 2021
edição: 1ª