Ao ler os poemas deste belíssimo Touros e lagartos, de Luana Bruno, a impressão que se impõe não é terrosa como os dois animais do título podem fazer supor. Avesso disso, os poemas anunciam a simbiose com o mar ou, quando menos, a guerrilha que o mar impõe ao que se quer sólido, ao que se quer estável: “farei de meu corpo/ uma enorme retina salgada que tu/ não encontrarás”, e complementa: “irei ao mar aos santos/ descalça de alma maruja (…)”.
Não é um livro de crenças arraigadas, quase sempre vãs. Semelha, sim, um romance de formação em versos, cuja voz do poema se nos dá a conhecer ao tempo em que se autoconhece: “de rio e mar,/ vou ao barro/ aos vermes que nele vivem/ e choram sozinhos/ como eu.”
Eixo importante de leitura aflui no poema XXXIV, em que se vai ao encontro de uma tal Adélia (Prado?) e de um tal Campos (Álvaro?). Ali e nos poemas seguintes, parece vir à tona a indecisão entre a delicadeza do amor burocrático, em Adélia, e o deixar-se rasgar pelos brutos, em Campos. Lugar ínfimo e ímpar este em que Luana faz residir sua poesia.
Por ser o primeiro livro da poeta, há que se ressaltar a organicidade formal e temática dos poemas. Não se vê neles o afã caleidoscópico que as estreias costumam ter, embora se conserve o frescor do achamento da poesia, como convém a quem adentra sua morada.
Quem conhece Luana, sabe que ela é uma pessoa em estado de poesia. Só isso bastaria. Mas o que vemos neste Touros e lagartos é que principia, também, uma jornada de grande poeta.
Marcos de Carvalho