Terral. O vento que sopra da terra para o rio. Que ultrapassa as cercas embandeiradas. Por cima, por baixo e de banda.
No Oriente, há a estação onde predominam ventos que sopram da terra para as águas. Aqui, pelas Alagoas, o chão, a cana, a fome e a coragem compõem um novo signo terreno. Um éter que se espalha sem cheiro.
Presença além-cercado.
Em suas 40 primaveras passadas, Minervino — que carrega seus anos e os do avô no nome — é um menino-negro, pai do menino-rio Francisco — este um Opará mirim desembocado nas terras da Branquinha (AL).
Poeta sempre a caminho, sempre passando, sempre entre. Natural de Maceió, residente em Branquinha e atuante como técnico administrativo na Universidade Estadual de Alagoas (Uneal), no campus de União dos Palmares.
Nesta obra, sua segunda em matéria de poesia, ele perpassa por onde hoje mora, por União, pela capital onde nasceu, por Murici, Messias, Pontal do Coruripe e Rio Largo.
Sempre um aterramento em cada recanto que vai: 72 poemas que seguem um fluxo direto, sem cercamento dividido por seções sumárias.
Há haikais, dísticos, quadras, tercetos, sonetos e mais. Nas “Quadras elementares”, ele já dá pistas do que pode vir a ser um projeto continuado usando os elementos da natureza: água, terra, fogo e ar.
A água já está em Antes e depois da chuva, seu livro de estreia. Agora, o chão se manifesta em Terra cercada. Dois dos quatro elementos naturais.
Da metade para o final, os poemas interseccionam o rio e a terra devastada (enchente que cobriu Alagoas e levou Branquinha da cartografia, com sua feira, bacias, bicicletas, batatas, laranjas e mandioca), nestas peças escritas e revistas entre 2015 e 2024.
Com tanto chão e pouco pão, pouca partilha de existência. Parece esquisito viver num mundo chamado Terra, em que nem todo mundo tem um lugar comum para plantar e colher suas memórias. Um lugar para morrer.
Veja o poema “A posse da terra”: as vírgulas são como as farpas dos arames que delimitam a área e o ponto-final, a ponta de que não se fala mais nisso: a terra tem dono. Um poema do tamanho do livro.
O salto por cima da cerca é necessário. E só nós podemos dar, por nós mesmos. Assim, abracemos uns aos outros nessa lida.
Apesar de o formato-livro cercar as palavras, a fim de que não saiam destes limites estabelecidos editorialmente, este livro é um “terramoto”.
Move nossos ventos internos, abalando as estruturas fixas, e prepara o terreno para que um novo bosque possa enterrar suas raízes em nós.
Os nós estão dados ao se abrirem as porteiras. O vento vem.
Breno Airan