Oferta!

Observatório

Disponibilidade: Brasil/Europa

Quando tenho dificuldade em adormecer,
conto os dentes com a ponta da língua
Como quem conta carneiros,
recito em silêncio um, dois…
Conto o espaço vazio dos sisos
Perco-me à frente, nos incisivos, e tenho de recomeçar
Há noites em que adormeço com o tédio,
há noites em que me demoro mais
Sinto a aresta do canino esquerdo e volto a senti-la,
vez após vez, saboreando a sua letalidade
Imagino-me a rasgar carne, primitiva
A defender-me de um agressor
Avalio a força que teria de fazer
A eficácia que teria ou não
As marcas que ao menos deixaria na carne alheia enquanto a minha perdia a vida
Isto quando tenho dificuldade em adormecer, claro.

(Adormecer, página 27)

10% de desconto
PRÉ-VENDA ATÉ 25/11/2024.

Os livros serão enviados em até 15 dias após o fim da pré-venda

R$45,00

_sobre este livro

Neste Observatório, como noutras viagens narrativas de Rita Canas Mendes, é preciso ir com cautela. A sua escrita é metódica e ludibriosa. Entramos neste livro de forma imperturbável, conduzidos por narrativas curtas de palavras suaves, com aquele sentido de humor despudorado, aparentemente ingénuo, que traz à ideia um dia de sol com um cocktail junto à piscina. Mas, de súbito, as luzes apagam-se. O ritmo cardíaco acelera e tateamos no escuro um cadáver aberto. Sem darmos por isso, já derrapámos e embatemos nesse inequívoco acidente de crueza e jugulares expostas.
Se, num primeiro momento, achamos que deveríamos ter evitado o impacto, a verdade é que damos por nós agarrados à adrenalina de não querer parar de ver até ao fim — os finais sucedem-se e são curtos, em aberto. Como em qualquer micro-conto que nos arrebata, estendem-se em ecos de um futuro indeterminado.
Nesta viagem ao centro da terra, qual Júlio Verne que se perdeu pelo caminho, descobre-se o inferno, que para nossa surpresa nos traz de tudo, em iguais doses de candura e de crueldade. Perceber, como Rita Canas Mendes escreve, que «até Deus fica sem imaginação, às vezes», conduz-nos ao lugar do precipício; o último reduto de fundamentos como a «compaixão amorosa», onde entendemos, claramente, que «Estamos aqui / e não estamos».
Tal como a nossa voyeur, que participa ruidosamente em silêncio, também nós nos alimentamos de tudo o que queremos ver e, simultaneamente, engolimos em seco depois de tudo aquilo que não queríamos ter sabido.
Entre grãos de arroz, marinheiros de água benta, suicídios falhados e a ideia tão esquecida de que o animal já teve alma, reside neste Observatório uma possível ideia de Humanidade — e talvez os detalhes, um dia, nos redimam.

Francisca Camelo

_outras informações

isbn: 978-65-5900-830-8
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 13x16,5 cm
páginas: 86 páginas
papel polén 90g
ano de edição: 2024
edição: 1ª

Carrinho

Cart is empty

Subtotal
R$0.00
0