A diferença na posição aparente de um objeto em relação a um plano de fundo, tal como visto por observadores em locais distintos ou por um observador em movimento. O conceito de paralaxe pode muito bem ser aplicado ao mosaico de abordagens e estilos que Aluízzio emprega nos 51 poemas destas Iminências de Agosto. A cada tapar de olhos, ou virada de página, o poeta maneja com domínio e sensibilidade esse jogo de esconder, ora com a primeira pessoa lírica, entre sóbria e perplexa, ora com jogos semânticos bem engendrados, ora com poesias visuais inspiradas, e mais do que isso, que homenageiam o poeta, compositor e cantor Arnaldo Antunes, e ainda relendo os caligramas de Apollinaire.
O próprio autor deste livro anuncia “veja,/só há um tipo de mau poeta/o que negocia com seus versos, pois/todo verso verdadeiro é suicida”. E é exatamente isso o que ele faz ao se recusar, de forma inarredável, a negociar com seus versos. Ao contrário. Aluízzio aponta sua lente para os abismos corrosivos e os jardins suspensos das relações cotidianas amorosas e filiais para logo em seguida tirar do seu tanque de revelação um olhar profundo e crítico sobre a hecatombe social dos nossos dias, e na sequência escrever sobre o ato de escrever. E o faz com a acuidade e a sabedoria dos escribas.
Iminências de Agosto é dividido em duas partes, “A vida bate” e “Chamar a si todo o céu com um sorriso”. São dois blocos que se desdobram em outras figuras de paralaxe, como uma teia em que a visão do leitor pode projetar a imagem deslocada do seu ponto real, com um simples fechar e abrir de olhos. E não deixa de ser curioso lembrar algo que foge à maioria dos escritores e poetas: o ponto, na geometria, é um objeto que não possui definição, dimensão e forma.
Ao leitor, aconselho que entre neste livro com a perspectiva dos indígenas que pescam em rios com arco e flecha, ou lanças. O alvo está onde não parece estar. Ao disparar, é preciso considerar que um poema se move no espaço. Portanto, flua no fluxo da poesia do Aluízzio fechando e abrindo os olhos, deixando-se levar pelas paralaxes que o conjunto aqui reunido proporciona. Mas, lembre-se, é livro de um poeta que descobriu algo fundamental a quem escreve. Em suas próprias palavras, “quando você se dá conta/de que não precisa de nada além de sua mandíbula/em brasa no altar”.
Caê Guimarães