Regras de fuga

Disponibilidade: Brasil

Todos os dias penso em partir.
Mas sinto o lodo das pedras,
o deslizar dos peixes e
o calor molhado do ar
de minha terra / minha terra é vermelha /
segurando-me as raízes,
e sou obrigado a ficar.

 

R$48,00

_sobre este livro

A poesia, tal como a música, é marcada por oscilações de sons e silêncios, instrumentos que tocam e param de tocar, pessoas que cantam e param de quando em quando, ritmos e pausas, presenças e ausências. Como evidenciar ou pôr em destaque no texto tudo que se refere ao vazio? Como falar sobre “a vida inteira que podia ter sido e que não foi”?

Pulverizando os versos destes poemas de Eleazar Carrias percebemos como é possível. Neles, o eu-lírico se declara não-poeta, afirma que nunca será poeta e que a matemática é a poesia mais bela. Justo a matemática? A “arte de resolver problemas”, em sentido etimológico. Ela, cujo trabalho é encontrar os valores incógnitos. A poesia mais bela é aquela que trabalha com os vazios, com os não-conhecidos, com o que se deseja ou quer preencher.

Talvez por isso diante de um dos primeiros problemas a que se coloca o poeta ao organizar um novo livro, a resolução foi matemática. Foram escolhidos apenas o primeiro e o último poema (ambos marcados por movimentos de partida) e os demais foram ordenados aleatoriamente, através de sorteio. Afinal, o poeta é a-matemático, é um “cientista sem método”. Além desses dois poemas limítrofes, predomina na poesia de Carrias a sensação de escape, não apenas físico, mas também discursivo. Embora deseje discordar, o eu-lírico concorda que o boi devorado é culpado pela própria morte.

É uma poética marcada por vazios. O que o poeta quer dizer com isso é que “as séries: / equilibram, não existindo”. “Engenharia” é encontrar Deus onde não há engenharias humanas, na floresta. Solidão é um aprendizado lento, entre amigos, e é aprendida na multidão. Uma poética que se apresenta nos gritos roucos, nos pedidos poucos (merrecas).

Além disso encontramos afirmações pela negação ou pela supressão ou por algum desvio de olhar ou pensamento. A identidade que o interlocutor no poema “Um violão folk” não tem é semelhante a um “uísque de Glasgow / envasado no Brasil”. Não é falso, tampouco é original. Mesmo as ironias trabalham com esse duplo afirmar-negar. Em “Quatro lições”, afirma que “a boa poesia só a si mesma se refere: / não cita nomes”, mas afirma que aprendeu isto com um amigo, cujo nome estampa no poema. Também o não se acostumar com o corpo amado, o perdão pedido para os corpos nus que vê, quando, na verdade, o pecado é desejo de quem olha (se pecado for).

A epígrafe do livro fez lembrar-me outro verso de Manuel Bandeira: “Fecha meu livro se por agora / Não tens motivo algum de pranto”. A poesia de Eleazar nestas Regras de fuga, parece-me dizer claramente: “Fecha meu livro se não te falta nada”. Eu ouvi. A mim falta, e fui até o fim.

Abilio Pachêco

_outras informações

isbn: 978-65-5900-583-3
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 13x16,5 cm
páginas: 56 páginas
papel polén 90g
ano de edição: 2023
edição: 1ª

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