Priscilla de Oliveira nos oferece em seu livro de estreia, Seu nome na minha boca, histórias que em narrativas diversas mostram como as relações familiares e amorosas são determinantes em nossas vidas. Nem sempre de forma agradável ou bem resolvida, seus contos cortantes têm em comum o devir mulher. Tendo esse tema como ponto de partida, as personagens surgem para falar de afetos e da força destrutiva de seus desejos reprimidos que pulsam como pequenos incômodos no cotidiano.
A autora disseca com maestria o lado mais íntimo e, por isso mesmo, às vezes macabro de seus personagens.
Há em cada conto a exposição da vida como um jogo de forças irracionais. Nomeado como delícia e terror, o conto escolhido como título do livro, “Seu nome na minha boca”, tem o clima da paixão encarnada sem romance, uma pitada de perversão revestida de erotismo, não há espaço para glamour.
Isso faz com que o livro de Priscilla apresente uma predominância feminina. São mulheres impulsivas, apaixonadas, que seguem o fluxo da atuação, levam a vida num ritmo norteadas por instantes de prazer e uma espécie de ‘não querer nem saber’ sobre o risco que correm. Sem amor avançam, sem prazer insistem. Ansiosas pelo futuro, teimam em lançar-se à própria sorte. Numa euforia contínua, elas estão ora buscando, ora fugindo. Insatisfeitas permanecem. Perdidas. Vítimas cambaleantes que no desfecho de cada história vivem a face trágica do amor.
E por aí a trama segue, deslizando nos trilhos de uma vida sem rumo certo, o que aliás pouco importa, pois o que está em jogo na trama é uma ética do desejo cego, que faz de cada linha uma continuação, ou uma emenda infinita, do que há de mais revelador do feminino em sua particularidade. Além disso, as lembranças de quem já se foi são avassaladoras, embaralham os tempos vividos do presente e passado que nunca chegam a vigorar como saudades. Efeitos desencadeados da falta que provoca estragos e da violência sofrida. Nas entrelinhas encontramos o abuso sofrido por traição, estupro ou incesto. Acreditem, as personagens a tudo sobrevivem (mesmo que precariamente), menos aos efeitos silenciosos de suas próprias lembranças.
Esta é a maior qualidade da autora: conseguir apresentar em seus contos uma trama que é capaz de revelar primorosamente o que não conseguimos jamais esquecer — que o amor marca para sempre a vida da gente, e não se vive isso impunemente.
Renata Salgado