A súbita insistência das coisas

Disponibilidade: Brasil

Entendo
absolutamente nada
da matéria escura
que sustenta os planetas
São mãos de grandes dedos
que se afunilam
e palmas abertas
como uma espécie de pianista
que toca
é só assim que entendo.

Melhor entendo
que não há lá grande coisa
para além do trombo
do teu corpo transitando
junto ao meu
num acidente de desnível
no bar na calçada
do subúrbio
às 2h da madrugada.

 

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_sobre este livro

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Nem todo dia forja em si uma poeta, por isso se adverte logo ao leitor que tenha a sorte-sina, o sobressalto de tropeçar neste (não tão pequenino) livro de estreia de Julya Vasconcelos: use um petardo, uma bomba bem pequena, para abrir os flancos dos sentidos e deixar-se navegar pelos líquidos e pelas imagens desta voz poética que, ao fim e ao cabo, sabe de matérias finas do inefável (como a já soprada Súbita insistência das coisas – no título) e se desdobra para chegar a ter o peso de uma viga, refundação de mundo, mas uma que seja pássara e se saiba água.

São imagens de uma voz que se insurge consciente de estar projetando o verbo em cena, por uma marcada via que se reconhece gênero-mulher; em estocadas como no poema O golpe: “corpo humano mulher brasileira vinte dedos” e se desdobram como as camadas da bonequinha russa Matrióchka, umas contendo outras mulheres em si mesmas, ser de multiplicidades. As palavras se apresentam como precisos pontos de sutura, nada sobra. A economia dos versos é a medida da justeza das imagens, o que explode são as reverberações do poético. No poema Ecocardiograma, o retrato do exame de funcionamento e estrutura do tal órgão (bomba de sangue), ao qual certa tradição atribui o sentir, é que nomeia e diagnostica as dores, delícias e idiossincrasias de saber-se: “feito ser mulher e ter medo/ de rua de pau e de faca/ feito tanta coisa triste e bruta/ que tem na vida.

Não há concessões ou deslumbramentos nesta estreia. A música que Julya compõe é o jazz, que sabe ser o improviso a técnica justa para harmonias se pintarem, para melodias se desdobrarem ao infinito de possibilidades em potência. Em Variações para um trompete sentencia: “na mortidão do tempo havia/ uma grande capacidade de improviso”. Há flores de obsessões aqui (traços do DNA de sua genealogia de poeta? Encontro ecos de Ana Cristina César; Adélia Prado…). A água, a liquidez da vida prosaica, a captura do banal recorrem, como na composição jazzística aludida: “eu posso abrir as águas que me separam de mim?”, indaga. E dou um salto à sentença-hipótese do poema Ondas curtas: “como se de repente eu fosse/ não mais uma mulher/ mas um satélite”. Sim, um satélite; uma antena; um inseto-fêmea e uma pássara-líquida: incontestavelmente poeta.

Renata Pimentel

_outras informações

isbn: 978-85-7105-097-6
idioma: português
encadernação: brochura
formato: 14 x 19,5
páginas: 70
papel: pólen 90 gramas
ano de edição: 2019
edição: 1ª

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