“O mapa nos trouxe até aqui ou nós chegamos por acaso?”
Este romance é uma selva inexplorada: entra-se por própria conta e risco, aos poucos, com atenção a cada passo. O caminho que se abre nos leva até uma clareira que ecoa a misteriosa história de Nabura, planeta que mudou a sorte dos personagens de Um tango de quatro mulheres.
“Permaneciam todos os habitantes do povoado em um perigoso estado de maravilhamento…”
A partir de um campo de bananeiras remoto, Flávia Farhat desenvolve esta obra repleta de ambiguidades e simbolismos que constroem os enigmas da trama — um relógio que anda para trás, um lago de gelo que muda de cor, um personagem descrito como “o último surrealista vivo” e outros tantos. Cada capítulo funciona ainda como um conto autônomo, reflexo do vigor criativo e sem amarras de Farhat. Por meio dos protagonistas, a autora percorre uma série de temas interessantes: senso de comunidade e de pertencimento; percepção de tempo e espaço; capacidade de adaptação; memória e esquecimento; isolamento e (re)abertura para a civilização.
“… e pouco a pouco perdiam a noção de como funcionava o mundo para além das folhas de bananeira.”
A floresta é duplamente desafiadora para nós, humanos: por um lado, o silêncio da mata obriga os personagens a confrontar as suas questões mais íntimas — a nível individual, estar vulnerável na natureza pode ser assustador e/ou libertador. Por outro lado, é essencial fazer parte de um grupo para sobreviver aos perigos e à escassez de recursos, e no entanto as dinâmicas de um povoado não são nada simples: exigem concessões e sacrifícios; incluem rituais que estreitam laços, mediação de conflitos, disputas de poder e tantas outras dificuldades… Contudo, não há futuro possível na solidão. Por isso — e porque não têm alternativa — os personagens da trama seguem em frente juntos, ainda que seus problemas particulares se entrelacem uns nos outros. Individualidade e coletividade estão presentes em cada página do enredo.
“O sentido da vida é o esquecimento.”
Nabura é planeta, é promessa, é ponto de partida e de chegada. E é palco deste tango de quatro mulheres que, mesmo dançado bem diante dos olhos do leitor, não deixa entrever todos os seus segredos.
Júlia Roveri